Meninos Bobos

março 21, 2008

– Pede pra eu te comer, filho da puta.


E eu pedia.


– E me chama de Senhor, palhaço!


E eu chamava.


Mas ele não era meu Senhor, era um desconhecido. Um cara qualquer, surgido do nada, de um jeito bem besta, alguém que até recebia para transar com outras pessoas, mas que, por uma razão que não sei, me comunicou que me queria como escravo. E eu cedi, assim bem fácil.


Bem fácil também eu concedia que me fizesse tantos xingamentos, deboches, humilhações, tantos tapas e cuspes na cara. Ele chacoteava do meu corpo e da minha inteligência, adivinhava minhas feridas e ria delas. Ele tateava minhas cicatrizes, tentava abri-las e quase conseguia, não fosse ser um reles desconhecido e saber disso. Ele não perguntou nada sobre minha vida ou sobre minha pessoa, até aquele instante na cama em que, exausto, se debruçou sobre mim, quase me abraçando, e quis saber quantos anos eu tinha. Breve momento de intimidade.


A cada tapa, a cada cuspida, a cada palavra, eu sentia muita raiva daquele homem. Ele me lembrava todas as situações de minha vida que eu odiava: meus primos idiotas, meu irmão babaca, os moleques na escola, meu pai intolerante. Quando ele esfregou seu pé no meu rosto e me fez sentir aquele cheiro e aquela pele nojenta que eu tanto abominava desde criança (eu repudiava pés quando garoto), quase dei um basta a toda aquela merda e mandei aquele filho da puta pro inferno, que eu não era masoquista, sofrer não era comigo. Mas por algum motivo aquele cheiro entrou em mim e aquele pé tocou mais do que a minha pele. De repente a minha boca e a minha língua buscaram aqueles dedos e aquela sola e eu não consegui evitar que meu corpo mostrasse àquele homem um prazer sexual até então ausente.


– Agradece, vadio.


Era o que ele mandava, a toda hora, e era uma das poucas coisas que eu não obedecia. Eu não agradeci os seus tapas, as suas cuspidas, eu não agradeci o seu mijo amargo nem o seu pé fedido. Eu não agradeci as socadas no meu rabo que não respeitaram, como todo o resto, os meus limites ao sofrimento. Eu não agradecia porque eu não era grato, porque a gratidão era algo que ele ainda não havia conquistado em mim.


Até que gozou na minha cara e caiu ao meu lado, novamente exausto. De olhos fechados, um menino extasiado de prazer.


Eu passeei os meus dedos pelo meu rosto, levei toda aquela audácia até a minha boca, pra sentir o gosto do que havia me acontecido e entender o que me era aquele homem e por que eu havia cedido àquela mentira (ou ainda imatura verdade) de Senhor e escravo e por que eu havia me entregado àquelas ofensas, me submetido aos prazeres daquele reles desconhecido. Eu tentei buscar fundas razões, mas tive medo de tocar demais o que eu sou e me restringi a olhar pra fora de mim e enxergar só aquele corpo estendido na cama. Eu vi aquele peito, aquelas mãos, aquelas pernas, aqueles pés, aquele Pau. Eu vi aquele rosto... aqueles olhos, agora abertos, me fitando, e eu vi aquela boca, sorrindo cinicamente, safadamente. Vaidade ingênua que só os meninos bobos têm.


Por que ele me dominou? – me perguntei em silêncio. Olhei nos seus olhos, retribuí o seu sorriso cínico, e, sem ingenuidade nenhuma, ciente do significado daquele Dominar e do exato valor daquele corpo na minha vida, pensei: porque ele é gostoso demais.


Conto de Hardlove, Exclusivo Bondage Man

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